Érica Araium
Idealizadora de Diálogos Comestíveis, estrategista de branding, marketing e comunicação. Jornalista. Palestrante. Ávida por #MotivosParaDialogar.
Érica Araium
Idealizadora de Diálogos Comestíveis, estrategista de branding, marketing e comunicação. Jornalista. Palestrante. Ávida por #MotivosParaDialogar.
E se pudéssemos colocar todo o oceano dentro de uma panela? Ora, já fizemos isso – e não nos demos conta até 2015, ano do “Acordo de Paris”, do caldo de problemas que vimos cozinhando. A sobrepesca é, ainda, assunto enfadonho. A ponto de a imprensa mundial se esquivar das redes enfadadas de overfishing. “Seaspiracy” (2020), da Netflix, joga alguma luz sobre o tema.
Fato é que, ao menos no Brasil, com seus quase 9 mil Km de costa e cientistas cada vez mais à deriva, são ainda raras as reportagens dedicadas à noção de que o que se demanda aos atores da indústria de alimentos e da gastronomia pode dar cabo à biodiversidade marinha.
Cada garfada conta. Para que algo faça sentido em águas turvas, é preciso “desgourmetizar”, simplificar, aproveitar integralmente. Resgatar o prazer e a curiosidade da descoberta acerca do “alimento”.
E se pudéssemos colocar todo o oceano dentro de uma panela, neste novo contexto? Pelas lentes de sujeitos como Nathan Myhrvold (fotógrafo e autor de Modernist Cuisine: The Art and Science of Cooking, 2013), ficaria interessante enxergar cozinhas mais nuas e cruas. Imagine essa panela chamada “Terra” - que é 70% água - tampada ainda pela estratosfera – já muito furadinha pelos gases do efeito estufa. Haja pressão.
Na parte mais exposta dessa espécie de “caldo primordial”, mas mergulhados entre os recifes de corais restantes, despidos de suas roupas especiais e gadgets culinários, sujeitos às intempéries (chuvas elétricas!), foodies e food trotters desolados, já aclimatados à pandemia de Covid-19, militariam contra o flutuante e abundante “plástico de uso único”. Será que nadariam com a mesma rapidez das mudanças climáticas no rastro de soluções para a manutenção da vida?
A depender do aquecimento global, sim. A temperatura superficial do oceano tem aumentado muito, muito rapidamente, segundo estudo de Zeke Hausfather, cientista de clima e energia da Universidade da Califórnia, divulgado pela revista Science em 2019 (How fast are the oceans warming? | Science (sciencemag.org). O oceano nos salva em banho-maria.
Uns outros consumidores (a grande maioria), afetados pela síndrome do “não faço ideia de onde vem meu alimento”, se deixariam levar, empolgados, por uma nova onda de hedonismo à mesa. Loucos por compartilhar momentos nas redes sociais, não deixariam de investir muitos euros ou dólares em experiências “ostentação”. E não por mal, mas por mero, “depois de tudo, eu mereço”. Por mero “efeito diva”. Como o filósofo Gilles Lipovetsky nos ensina, em tempos de “felicidade paradoxal”, mesmo o luxo está acessível a todas as classes - desde que haja crédito para acessá-lo.
Ordenariam, por isso, novos estilos de “sashimi” e “caviar” com ajuda de cardápios de realidade ampliada (RA). “Salve-se quem puder! O mundo está quase acabando, mesmo. Farinha pouca, meu pirão primeiro”, diriam esses alheios ao fato de que os peixes ao redor foram produzidos em laboratório. E, ainda assim, contém microplásticos.
A despeito do que é moralmente aceitável para este contexto de perdas (até 1º de junho de 2021, 3,4 milhões de mortes por coronavírus foram registradas pela OMS; houve perda equivalente a 255 milhões de postos de trabalho em 2020, segundo a Organização Internacional do Trabalho).
Pensar sobre os oceanos é navegar precisamente. Rastrear os pescados que se consome, maneira interessante de não virar ingrediente de garum, molho de peixe mal cheiroso, picante e concentrado que os romanos adoravam.
Desde 1972, 5 de junho é o Dia Mundial do Meio Ambiente - data estabelecida pela ONU (Organização das Nações Unidas) durante a Conferência de Estocolmo. Especialmente em 2021, nos perguntamos, do lado de cá do Atlântico, qual é o “oceano que precisamos para o futuro que queremos”? Fico com os ex-escafandristas mais sonhadores que, deixando de ser foodies, decidiram redescobrir os sete mares num único fôlego restante.
A cada vez que você respira e a cada vez que se alimenta de produtos de origem marinha, o oceano está em você. Temos #MotivosParaDialogar.
L(i)xo extraordinário
As fotos acima, retiradas da internet, ilustram trabalhos de artistas contemporâneos que transformaram "lixo" em obras de arte. Em comum, a grande maioria contém plástico (resíduo, reciclável). A seguir, mais detalhes sobre essas peças.
1 - A escultura de baleia, representada em tamanho real, com plástico, é obra do artista lisboeta Arthur Bordalo II. Na foto, "Whales Day", em Bora Bora, Polinésia Francesa, 2019.
2 - Esta obra faz parte do projeto estadunidense "Washed Ashore". Em Oregon, os participantes da iniciativa da professora Angela Haseltine Pozz coletam resíduos encontrados nas praias para auxiliar na educação infantil.
3 - "Menchinu", de Hideaki Shibata e Kazuya Matsunaga, 2014, Cultural Park, Fubon Art Foundation, Tóquio, Japão.
4 - "The Bearer Irma" é uma das obras icônicas do brasileiro Vik Muniz. Em 2008, no aterro sanitário de Gramacho, baixada do Rio de Janeiro, o artista criou, com ajuda dos catadores, uma série de obras fotografadas e documentadas no ducumentário "Lixo Extraordinário".
5 - "Garbage' fish", instalado em Helsingor (Elsinore), perto do Kronborg Castle, na Dinamarca, 2014. Outra obra de Hideaki Shibata. A técnica utilizada pelo artista é conhecida como Yodogawa.
6 - Na reserva de Sian Ka’an, na costa caribenha do México, patrimônio da UNESCO, o lixo oriundo de mais de 50 países motivou o artista Alejandro Duran a criar instalações que “conversam” com a vegetação nativa, assim nasceu o projeto "Washed Up". Na foto, Bombillas (Bulbs), 2013.
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