Sushi à Dali (ou de tempos velozes e surreais)
Sushi à Dali (ou de tempos velozes e surreais)
Érica Araium
Idealizadora de Diálogos Comestíveis, estrategista de branding, marketing e comunicação. Jornalista. Palestrante. Ávida por #MotivosParaDialogar.
Érica Araium
Idealizadora de Diálogos Comestíveis, estrategista de branding, marketing e comunicação. Jornalista. Palestrante. Ávida por #MotivosParaDialogar.
A quantas anda a alta gastronomia em tempos tão surreais? Se Dali (sim, Salvador, o pintor) vivesse neste tempo, talvez pintasse com outros traços e cores “A Persistência da Memória”. Seria um registro de sua criatividade. À Dali, um sushi, por exemplo, “derreteria” ante o aquecimento global – o que permanece “fresco” no agora?
Porque são estes tempos efêmeros em que o dito revisita o não-dito (o inventado, as fake, que não são news) para confrontá-lo e se reafirmar “verdadeiro”. Em que a Internet das Coisas (IoT) flerta com o 5G. Em que cozinheiros voltam a seus postos e legam seus processos comunicacionais (cozinheiro que é cozinheiro cria em rede, sempre em rede) à sorte de contar com os alimentos em suas melhores formas, aromas, épocas e terroirs.
A quantas anda a alta gastronomia em tempos tão surreais? No começo deste cenário em que "Big Farms" (parecem mesmo) "Make Big Flues" - voltamos aos anos 1960 com uma referência dos anos 2020 -, havia ainda um visgo de nouvelle cuisine para coroar as experiências dos usuários embebidos em enlatados mágicos e soluções agrícolas em alta escala. Até ali, a cozinha clássica francesa ditava as regras de um mundo mais sisudo em que estripulias como fizeram Vatel em seus banquetes ou Carême, o “cozinheiro dos reis”, fã das esculturas de açúcar, era algo mesmo inovador.
Salvador Dali, na beira dos anos 1970, promovia jantares de gala em sua casa na Catalunha. Gastroperformances. Jantares criativos. Experiências ultrassensoriais, cheias de storytelling para o usuário. Para alguns, os enredos e os pratos idealizados por Dali mais pareciam delírio “na medida” para as elites. Algo documentado em livro publicado em 1973 e relançado pela Editora Taschen em 2016, "Les Diners de Gala", da Editora Taschen, (uma obra prima, diga-se, para ser vista e revista, nem tanto para ser “cozinhada”, apesar de haver "receitas").
Em 2020, em meio à pandemia, vimos levas e levas de cozinheiros e restaurateurs em desespero. Dark kitchens e delivery viraram sinônimos do cotidiano. Cozinhar com o que há disponível localmente, obviedade a ser levada a sério. Menus e reservas diminutas, idem. Nesses tempos tão surreais, porém, a quantas anda a alta gastronomia?
Para que e pare quem escrevem os jornalistas e produtores de conteúdo quando tratam dessa fresta do mercado de alimentos e bebidas chamada “restauração”? Para quem fazem posts recomendando a última novidade que, invariavelmente, é atestada como a “melhor” do momento? Para quem vão (e para quem servem) as estrelas dos guias? Em que céus da boca estouram as melhores sensações segundo os críticos?
Desde 2015, fazemos provocações criativas – à Dali como agora, à nossa moda, à moda do usuário. Sem jamais deixar de lado a sensatez que a noção de “alimento” nos imprime. Revisitamos nesta peça, por exemplo, algumas referências para pensar, com elas, em fatos que afetam a gastronomia a alimentação e a noção de alimento:
Temos uma vida em desequilíbrio. Qualquer semelhança da vida real com o roteiro surreal de "Koyaanisqatsi: Life out of balance" (1983), de Godfrey Reggio, não é mera coincidência nesta era do antropoceno.
Comer “bem” nestes tempos febris é sobreviver a pandemias que não cedem.
A quantas anda a alta gastronomia em tempos tão surreais?
Esse post continua... aqui... Diálogos surreais (e normais) para 2021 (dialogoscomestiveis.com.br) LEIA AGORA!
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