AI Food

"É preciso rastrear o comestível. Ponderar sobre a origem, o caminho e o fim dos alimentos. A segunda frase, aqui parafraseada por já haver sido incorporada a ene discursos poliglotas, inclusive a este, permeia um sem fim de noções. A primeira, porção mais original, situa o leitor de que o Dossiê Comida da edição 198 da ComCiência (Unicamp, 2018), marchado a muitas mãos numa cozinha imaginária, barulhenta e linotipada à medida; e servido ainda fresco, deve ser devorado da capitular ao ponto final e revisitado como repeteco daquela saideira “das boas”. Desde 1999, nunca se falou tanto em gastronomia no Brasil. Não com a propriedade multidisciplinar que merece este prato cheio do jornalismo cultural. Pela força do hábito, pode-se determinar a organoléptica do amanhã". Este texto integra a dissertação Diálogos Comestíveis, apresentada à Unicamp em 2020. Estendemos aqui a discussão, agora focada na indústria de alimentos. E convidamos Cristina Leonhardt, a Sra Inovadeira, para pensar conosco. Aproveite!

Hoje, nesse mundo veloz, ambíguo e cada vez mais multitelado e compartilhado, as tarefas complexas exigem em média oito pesquisas para serem concluídas. É mais fácil, portanto, "dar um Google". O Modelo Unificado de Multitarefa do Google (MUM), apresentado em 2021, é um dos primeiros modelos de IA multimodal do buscador e tem evoluído. É ele, de certa maneira, "quem acha" boa parte dos conteúdos que importam para cada indivíduo: imagens, vídeos, textos. E pode encontrar informações relacionadas ao assunto pesquisado, criando conexão com tópicos relevantes para o leitor.

E se pesquisarmos todos juntos por "gastronomia brasileira" ou "food art" "sustentabilidade no Brasil", quais seriam os resultados? Que tipo de fomes temos apaziguado entre buscas e buscadores? Qual será o FAQ do modernista de 2022? Em 2021, a pergunta "Como fazer horta em casa?" exploudiu, por aqui. E a busca mundial foi por isso: https://trends.google.com.br/trends/yis/2021/BR/

 

Cristina Leonhardt, a Sra Inovadeira (divulgação)
Cristina Leonhardt, a Sra Inovadeira (foto de divulgação)

 

POR UM DESIGN CENTRADO NA SOCIEDADE

A fim de destrinchar este universo assustador e encantado de nossos desejos de usuário por comida e  inovação, provocamos Cristina Leonhardt, a Sra Inovadeira, a nos responder uma única (porém difícil) pergunta. Como de hábito, a fundadora do site Sra Inovadeira e co-fundadora da Tacta Food School, onde atua como Diretora de Inovação para projetos de Gestão Estratégica de P&D e Desenvolvimento de Produtos, abriu sua caixa de pandora. E abriu nossos horizontes com esses #MotivosParaDialogar. O design centrado no usuário está ultrapassado. Seria bom haver um design centrado na sociedade, no planeta. Os ais e as AI's podem ajudar.

 

DIÁLOGOS COMESTÍVEIS - Cristina, ambientada no centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, estou ponderando quem seriam os nossos "modernistas" atuais. Os inovadores. Os questionadores! Em que medida as escolhas que fazemos guiadas pelos buscadores como Google e afins norteiam o desenvolvimento da indústria de alimentos? Em que medida, nos últimos anos, os insights que o BIG DATA acumulou nessas plataformas e, claro, as AI's que trabalham por elas, influenciam a criação de produtos para os brasileiros?

 

Cristina Leonhardt - Tudo que a gente faz na internet, como tu sabes, deixa rastros. Esses rastros podem ser lidos pelas nossas mídias sociais, podem ser lidos por programas que busquem esses rastros por uma inteligência artificial. E, sim, já são usados continuamente como base para desenvolvimento de produtos. Eu posso até te mandar uns artigos sobre isso, sobre como o design tem se aproximado da inteligência artificial, do uso de Big Data e tal. 

Acho que um exemplo de desenvolvimento de produtos é a Netflix. É bem claro. A capa dos filmes que aparece pra ti na Netflix já é baseada no teu consumo, já é uma inteligência artificial que entende quais são as imagens às quais tu reage. E adapta-se a capa daquele filme para ti. Veja um filme no teu perfil e um filme no perfil de uma outra pessoa. É porque essas capas elas não são pré-selecionadas por alguém no Netflix. Isso é uma inteligência artificial que, conforme as atividades daquela pessoa, coloca a capa. Ela tira um frame do filme que vai se conectar com o perfil da pessoa que está assistindo. Então isso já é um exemplo, né? Do uso dessas migalhas, dessas trilhas de informações que a gente vai deixando pela internet. Nesse caso, para desenvolver um produto, ou uma parte de um produto, que é a capa do filme, algo bem importante (para a Netflix) porque é como se fosse uma venda por impulso ali. Uma das coisas que te faz entrar no filme é a capa.

DIÁLOGOS COMESTÍVEIS - Dá para entender direitinho como essa "mágica" funciona no blog da Netflix, no Medium. Saca só! E no universo food? Já dá para falar em AI FOOD?

Cristina Leonhardt - Na indústria (de alimentos), a gente ainda não tem um uso tão massivo dessas informações. Várias indústrias estão passando por essa transformação. Posso dar como exemplo a Nestlé, que tem uma área específica de transformação digital. Que está entendendo isso, fazendo venda direta ao consumidor e entendendo também dessas informações na internet. A gente tem a Coca-Cola, também. Não no Brasil. Pode ser que tenha projetos no Brasil. Mas tem um projeto bem famoso da Coca-Cola nos Estados Unidos, no Canadá e na Europa das máquinas free style, que através das vendas de produtos, foram capazes de desenvolver um produto novo através da análise das informações. São quarenta mil pontos de venda dessa máquina. 

Tem outras aplicações que temos visto, como algoritmos que vasculham a internet, fazem uma análise de dados de sites, de blogues, de influencers, de receitas, de menus de restaurantes que estão disponíveis na internet também para fazer uma predição de tendências. Um deles é a Spoonshot

 

DIÁLOGOS COMESTÍVEIS - Esta é uma observação pertinente e que está no DNA de todos os #MotivosParaDialogar que já levantamos. E esse batalhão de pessoas “diz” ter “fome” de quê? Qual o papel do chef de cozinha na promoção (melhor seria dizer divulgação cultural e científica) de uma alimentação mais sustentável? E do jornalista? E ofoodies, por exemplo, que desde a década de 1980, são os “novos” epicuristas que não perdem uma novidade ou gadget culinário à mesa? Que responsabilidade ao dizer o que quer que seja e legar cada cacartere à nuvem!

Cristina Leonhardt - Enfim, a gente tá vendo pipocar, ao redor do mundo, uma série de aplicações utilizando inteligência artificial para dar conta da Big Data. Para informar os processos de desenvolvimento de alimentos no mundo. Ainda não é tanto uma realidade no Brasil. Mas, com certeza, são informações super relevantes que podem ajudar, sim, a guiar melhor os caminhos da indústria de alimentos.

 

 

Cena de 35 Fragmentos, de Simone Mattar
Cena de 35 Fragmentos, de Simone Mattar (foto: Diálogos Comestíveis). Leia aqui no blog!

 

A gente trata muito isso dentro do design. Fiz uma disciplina no mestrado que era inteligência artificial aplicada ao design. E o que a gente tratou ali foi de como é que a gente pode utilizar  como uma coleta de informação na fase de pesquisa. Hoje, quais são as técnicas que o design usa normalmente? A gente faz muita entrevista, faz grupo focal, faz shadowing, faz mapa de jornada, faz workshops com os participantes. Tem uma série de ferramentas que você pode utilizar. Você pode até criar as suas ferramentas. E o Big Data seria mais uma dessas ferramentas, mas com o “pequeno detalhe” de que, ao invés de uma análise de uma persona criada a partir de entrevistas com umas dez, quinze pessoas, ou a partir de dez ou quinze interações com personas, posso utilizar informações reais do comportamento de milhões de pessoas. E, aí sim, descobrir, por exemplo, que, no meu mercado, não tenho uma persona ou duas, tenho cinco. Que tenho uma persona que tem características completamente diferentes das outras quatro. E posso entender quais são essas características na minúcia e desenvolver produtos mais focados, mais adequados para toda complexidade que aquela pessoa tem. Sabendo utilizar os dados, fazendo análises, é possível entender como é que essas pessoas se agrupam. Fazendo análise de redes, descobrir também como essas pessoas se relacionam. Quem são as pessoas chave. Também é possível fazer a mineração de texto, que é uma técnica que também se usa muito. São várias técnicas dentro da inteligência artificial que podem nos ajudar.

Mas é claro, devo falar isso fazendo uma vírgula aqui. O estudo dentro de uma perspectiva, no momento, é centrado no usuário. Essa também já é uma perspectiva ultrapassada. Se a gente for pensar usando técnicas do design, da antropologia, ou não, toda a indústria tenta fazer coisas centradas no seu usuário. Se faz bem, se faz mal, a gente pode questionar os resultados. Eles falam por si, nem todas as empresas têm muito sucesso nisso. Mas todo mundo gostaria de satisfazer o seu usuário pra gerar recompra. 


"O que a gente precisa, na verdade, daqui pra frente, que estamos precisando há anos, na verdade, e que uma hora teremos de acordar pra isso, é um design centrado na sociedade, um design centrado no planeta."

 

Se a gente satisfizer só o usuário, ainda é uma perspectiva muito egoísta. Aquela pessoa consegue tudo que ela quer com um carro super possante, consumidor de combustível fóssil e super-rápido e tal. Mas, para isso, está matando o meio ambiente, consumindo recursos até não poder mais. E a gente vai dizer "ok" para isso?

 

Então, essa ultra satisfação, esse hedonismo extremo, a satisfação dos desejos do usuário é vista como algo ultrapassado. Neste sentido, algoritmos e o BIG DATA também podem nos ajudar.

 

Porque compreender e equilibrar os desejos das pessoas com o que o planeta consegue oferecer de recursos também é algo bastante complexo. E que pode precisar de um apoio de algoritmos ou de sistemas computacionais que possam nos ajudar a entender a melhor situação. 

Por exemplo, para gente medir o impacto da melhor embalagem, se de vidro ou de plástico, há uma coisa chamada análise de ciclo de vida. E a análise de ciclo de vida de produtos alimentícios é extremamente complexa porque são cadeias muito longas. Normalmente, a pessoa tem dificuldade de fazer isso à mão, rascunhando no papel. Então os algoritmos podem ajudar também a compreendermos essa montanha de consumos e emissões. De poluentes, de resíduos, de descarte etc. Dentro de um contexto de se querer equilibrar e ou reduzir ao máximo o uso de recursos e a emissão de poluentes e, ao mesmo tempo, satisfazer o usuário.

Vejo que o próximo passo que a gente precisa dar é justamente nesse caminho. De incorporar nas inteligências artificiais as demandas de sustentabilidade que a gente tem no planeta e que, obviamente são necessárias paro nosso futuro. 

 

EM TEMPO!

 

Quer saber mais sobre esse assunto e se conectar a profissionais visionários?

O Horizonte 22 Food é um evento online que discute o futuro dos alimentos e responde à pergunta: o que 2022 reserva para o mercado de alimentos. Acontece entre os dias 16 e 17 de fevereiro. Isso é que é ser conectado à sociedade! As inscrições são aqui: https://tactafood.school/horizonte-22-food/

 

 

 

 

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