Lokum e os lados mais doces de Istambul

Diálogos Mundo Afora nº2 - Um convite inesperado do departamento de promoção do turismo da Turquia levou-me a conhecer, em 2011, uma das cidades mais incríveis da Europa - ou seria da Ásia? Das duas! Umas das particularidades de Istambul é fazer parte de dois continentes divididos pelo Estreito de Bósforo. Outra, a riquíssima gastronomia. (Por Lélia Rezende, Mundo Afora Viagens)

laugh Harmoniza bem comEy bostanji (Istanbul) Kemal Tanriverdi. Ouça na playlist de Diálogos Comestíveis.

 

Turquia, uma metrópole milenar entre os continentes Europeu e Asiático
Turquia, uma metrópole milenar entre os continentes Europeu e Asiático. Fotos: Érica Araium (arquivo pessoal)


Se viajar aguça os sentidos, posso afirmar que o destino provoca uma avalanche de sensações: os toques bizantino, romano e otomano das construções, os inconfundíveis mosaicos, os ruídos e canções que soam das mesquitas e os sabores encerrados nos mercados.

 

Doces turcos: o lokum é um dos inúmeros tipos de doces disponíveis nos mercados de Istambul
Doces turcos: o lokum é um dos inúmeros tipos de doces disponíveis nos mercados de Istambul

 

De tudo que vi, senti e experimentei por lá, guardo na memória o lado mais doce, suculento e colorido da cidade que já foi alvo de diversos impérios em meio a grandes batalhas – e, hoje, protagoniza novas disputas. Especialmente do popular doce turco, o lokum, conhecido, também, por turkish delights. A guloseima foi criada, em 1777, por Haci Bekir e, por incrível que pareça, a loja funciona no mesmo local até hoje, comandada pela quinta geração da família. O preparo da goma parece simples, mas requer paciência. Segundo especialistas, o doce deve derreter na boca e não grudar nos dentes. 

O perfume dele lembra uma mescla de frutas cítricas, flores e menta. As cores, que vão desde o verde do pistache ao vermelho da romã, encantam. Como recheio, de tudo um pouco está permitido. Pistache, coco, amêndoas e até chocolate. Servem o lokum, tradicionalmente, sem tanto rito, como sobremesa e acompanhamento para o chá e o café.

Um dos melhores lugares para conhecer, provar e comprar essas delícias é o Mercado Egípcio (1663), também conhecido como Mercado de Especiarias, localizado no bairro de Eminonuele, pertinho da Mesquita Nova e em frente a Ponte de Gálata. Ele tem formato de ele (L) e comporta todos os sonhos do mundo.
 

Na Ponte de Gálata, é comum ver pessoas pescando e comer balik ekmek (pão com peixe)
Na Ponte de Gálata, é comum ver pescadores e comer balik ekmek (pão com peixe)

 

Não é exagero dizer que os vendedores falam a língua que você quiser ouvir. À época em que caminhei naquelas ruas, o português era afiado e havia um grande incentivo para que houvesse mais vendedores treinados a bem-receber os brasileiros, que passariam a assistir aos percalços dos personagens da novela global Salve Jorge, de Glória Perez, gravada por lá naquele mesmo ano.

Também não é exagero dizer que qualquer vendedor o fará acreditar que você está sempre ganhando nas transações. Pechinchar é hábito comum e recomendável por lá.

As diversas lojas de dentro e do entorno do mercado vendem de tudo – até os doces turcos, claro, em diversas embalagens – se a granel, vácuo no momento da compra. Dica ao viajante que queira aproveitar para carregar a mala com produtos frescos e transportá-los com segurança. Um quilo de lokum custa entre US$ 12 e US$ 15. 

 

 

Vá com tempo e reserve pelo menos um dia inteiro para explorar o Mercado Egípcio e redondezas. Prove das castanhas, frutas secas, especiarias, chás e conheça o artesanato. As mais lindas e apetitosas romãs de todo o mundo, aliás, são as turcas, que ficam ótimas bem em novembro. Pode parecer exagero, mas foi um caso de amor à primeira vista.


SAÍDAS E ALERTAS

Brasileiros têm o privilégio de chegar à metrópole em voos diretos: são cinco opções semanais (segunda, terça, quinta, sexta e sábado), com saídas de São Paulo. As tarifas variam entre U$ 900 e 1.200, dependendo da época do ano.

Visitei a cidade em novembro, no final do outono. As atrações turísticas ficam mais tranquilas, o frio leva a um certo bater de dentes, nada que um bom agasalho não resolva. No verão, vale lembrar, a temperatura pode chegar a mais de 30 graus, algo a que estamos habituados.

É uma pena, contudo, pensar que, desde o início dos conflitos na fronteira da Turquia com a Síria, e, ainda, em função da onda de atentados  em 2016, o número de visitantes caiu bastante no país. 4,5% do Produto Interno Bruto de Istambul, principal destino turco, decorre do turismo. 

A Turquia faz fronteira com a Síria e o Iraque, fato que apavora muitos turistas. Atualmente, o clima se mantém “calmo” por lá – há segurança reforçada nos aeroportos, marinas e principais pontos de visitação, que contam com detectores de metais. Recomendação das autoridades? Não visitar as regiões próximas às fronteiras turcas, pelo óbvio.

 

 

Mesquitas da perspectiva da Santa Sofia, Istambul, 2011


TEMPERO DIÁLOGOS BY ÉRICA ARAIUM
 

Não é preciso dizer, mas reforçar. Istambul tem programa para todas as sete vidas dos milhares de gatos que convivem com os viajantes em cada esquina. Duvida da relação milenar dos bichanos com os humanos? Dê uma conferida no documentário Kedi (2017), que trata exatamente disso, em Istambul.

 

Istambul tem programa para todas as sete vidas dos milhares de gatos que convivem com os viajantes em cada esquina
Istambul tem programa para todas as sete vidas das centenas de milhares de gatos que convivem com os viajantes, em cada esquina

 

Não é raro vê-los circulando, dedicadamente, pela região do Mercado de Especiarias e Ponte de Gálata – justamente a que liga a Istambul Europeia a Asiática, separadas pelo Estreito de Bósforo - atrás de uma sobra de balik ekmek (pão com peixe) ou de peixe fresco, fisgado no ocaso. Por ali há restaurantes de frutos do mar diversos. E gente mais diversa ainda. Locais. Comida local como o kebab – toda preparação com carne, praticamente, é nomeada como kebab. Comida de rua. Como o pão de argola (simit, bom de provar com iogurte fresco ou desacompanhado mesmo, quentinho, de preferência). Comida para comer como comem os locais.

 

O simit (pão argola) é ideal para comer na rua, quentinho.
O simit (pão argola) é ideal para comer na rua, quentinho

 

É bom saber, também que os doces turcos, herança islâmica em grande parte, democratizados pelos otomanos, por fim, podem ser divididos em certas categorias.

Há panquecas, bolos e massas mais farelentas (sherbets), uns regados com calda de calda de açúcar. O lokum remonta ao século 19, e é a sobremesa (helva, termo mais genérico para designar qualquer doce turco) menos complexa, por assim dizer. Há ainda aqueles doces à base de frutas como damascos e peras e marmelos servidos com calda de açúcar e frutas secas – quase em todas as refeições. Por outro lado, o akide seja talvez o confeito mais antigo (remonta à época dos otomanos). E há uma grande variedade de pudins, como o kazandibi, que tem uma casquinha crocante e é macio por dentro; e de arrozes doces.

Dá para aprender alguma coisa sobre a confeitaria e os pratos salgados turcos no Centro Cultural Brasil-Turquia.

 

Detalhe de mesa de restaurante na Capadócia
 

 

POR ONDE ANDAMOS


Vale dizer que foi nesta viagem, há sete anos, que conheci Lélia Rezende. heart Bebemos muitos cafés, arak, cervejas e vinhos juntas; e, também, chás, de romã, do Mar da Mármara ao Mar Negro, de barco, pelo o estreito do Bósforo; e a pé, por Beyoğlu (bairro mais descolado) e Sultanahmet, península em que estão todos os pontos de interesse: Museu de Hagia Sofia, a Mesquita Azul, o Palácio de Topkapi, o Grand Bazar e a Cisterna da Basílica. Esse trecho, especialmente, é para ser percorrido em dois ou três dias caminhando e curtindo.

 

do Mar da Mármara ao Mar Negro, de barco, pelo o Estreito do Bósforo
Do Mar da Mármara ao Mar Negro, de barco, pelo o Estreito do Bósforo

 

Lembro do aroma doce das castanhas portuguesas vendidas em carriolas, na saída da Hagia Sofia, Santa Sofia (Sabedoria Divina), que ainda passava por restauro. Epicentro do mundo, foi erguida e reconstruída algumas vezes. Foi erguida na então Constantinopla, entre 395-540; “acolheu” os impérios Romano (bizantino, cristão) e otomano (os muçulmanos transformaram a igreja em mesquita). A idade média termina em 1453, quando os turco-otomanos celebram a queda de Constantinopla. Somente em 1935, o local da sabedoria se torna museu, graças a Atatürk, primeiro presidente da República da Turquia. Há história para respirar ali e ao redor.

 

No outono, vale provar as castanhas portuguesas vendidas em carriolas, na saída da Hagia Sofia e arredores
No outono turco, vale provar tudo que houver de fresco e quentinho sendo vendido na saída da Hagia Sofia e arredores

 

Para aprofundar as descobertas sobre o país, é preciso aproveitar a região da cidade de Göreme, QG da Capadócia de cidades subterrâneas e casas construídas nas pedras, de aspecto vulcânico e lunar. O voo de balão, que depende de uma série de condições climáticas – e tivemos a sorte de fazer - deixou saudade. Foi a temperatura mais baixa que enfrentei até aqui: cerca de -20°C, às 4h, hora de acordar para o passeio por sobre os “chaminés de fada”, por entre vales, na terra de São Jorge.

 

Voo de balão: -20°C, às 4h, início da aventura rumo aos “chaminés de fada” na terra de São Jorge da Capadócia
Voo de balão: -20°C, às 4h, início da aventura rumo aos “chaminés de fada”, na terra de São Jorge da Capadócia

 

Foi também o lugar mais legal em que provei o pottery kebab, cozido à base de carne, típico da cozinha regional, feito dentro de um pote de barro, no forno à lenha, lentamente (por cerca de 4h). Provamos do pão pide (pão balão) com mezze, dançamos um bocado, pedimos umas Efes (Pillsen bem comum e tranquila, estilo Standard American Lager, sussa, sem pretensão) antes de seguirmos para o hotel. 

 

Pottery kebab, cozido à base de carne, típico da cozinha regional, feito dentro de um pote de barro,típico em Göreme (Capadócia)
Pottery kebab, cozido à base de carne e legumes, típico, feito dentro de um pote de barro, em Göreme (Capadócia)

 

No mesmo dia, à noite, rodopiantes pelo enlevo de tanta beleza, assistiríamos ao ritual sema da Ordem dos Dervixes (ritual místico de ascensão espiritual que simboliza o amor divino, a exaltação e o caminho para chegar aos céus). 

 

Os dervixes rodopiantes: enlevo
Os dervixes rodopiantes: enlevo


Pensando bem, e revendo fotos e vídeos para esta partilha de Diálogos Mundo Afora, penso bem: está na hora de voltar a Turquia. Bora, Lélia? Temos mais #MotivosParaDialogar


 

 

 

 

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